segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Clara

Autor convidado: Daniel Mois

Posso sozinho ficar
Sem ninguém para abraçar
Sem ninguém para lembrar
Posso nunca mais beijar.
Posso nunca mais amar.
 Posso nunca mais sentir.

Posso ver o meu amor,
 que causaste tanta dor,
 ser levado pela imensa maré em que se transformou.

Só não posso te esquecer.
Não permito te esquecer.
Não sei como te esquecer.

Posso em uma noite fria
 rezar pela luz do dia,
rezar por sua alegria

Posso viver de saudade,
aguentar a eternidade.
 Posso deixar de sorrir.

Posso pôr-me a cantar,
posso pôr-me a imaginar.
Posso pôr-me a delirar pela luz de seu olhar.

Só não posso te esquecer. Não permito te esquecer. Não sei como te esquecer.

Posso sempre a visitar,
uma flor a entregar,
 e mostrar que em outra vida, nosso amor não morrerá,
E se Meu Deus permitir,
posso à ele então pedir,
que agilize nosso encontro em uma terra iluminada.
Então Claro(a), minha amada,
aguarde minha chegada.
 Dessa vez eu poderei virar seu anjo da guarda.

Só não posso te esquecer. Não permito te esquecer. Não sei como te esquecer.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Marcas invisíveis

Corpo puro
Intocado
Mantido como quando nasceu
Perfeito
Lindo
Sem defeito algum
Invejado
Idolatrado.

Olhe mais de perto.
Mais perto.
Não para o corpo
E sim para a alma.
Olhe bem profundamente
Veja como jorra sangue
Veja como foi destruído
Estraçalhado
Veja como não se regenera
Veja como suas feridas apenas abrem mais
E mais
E mais.
Agora olhe para o corpo novamente.
Enxergue as imperfeições
Cicatrizes, hematomas, cortes e pontos
Escondidos com maquiagem
Ignorados pelos olhos cegos por vontade própria.
Agora diga:
Onde está a beleza tão venerada de antes?

Porcelana quebra como
Papel desmancha na água.





segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Texto para meu inconsciente

Olá, meu outro eu.
Ou seria melhor dizer meu eu inteiro
Que só eu conheço
E não mostro pra mais ninguém?
Meu pássaro negro
Que não deixo em uma gaiola
Mas em um jardim
Meu campos elíseos
Onde está livre para voar o quanto quiser.
Por que chora tanto, pequeno pássaro?
Seu grito; tão alto que ressoa em minha cabeça
Por favor, pare, isso dói.
E não há algodão que me faça ensurdecer.
Por favor, pare.
Não quero que deixe de cantar, mas pare de gritar.
Não quero usar fumaça
Ou álcool
Para te matar
Não quero te machucar,
Então não me machuque.
Eu sei como é difícil
Estar sozinho
E passar o resto de seus dias ouvindo apenas a sua voz.
Mas lembre-se,
Podemos conversar entre nós mesmos.
Você terá a minha voz
E eu terei a sua
E não precisaremos de mais ninguém.
Não precisaremos de outras vozes
Ou outros cantos
Poderemos viver eternamente nesse jardim
Aguardando essa chuva cessar.

Meu amado pássaro negro
Vamos criar um muro
Porque não precisamos de mais nada
É melhor não conhecer outros rostos
Do que vê-los partir.



segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Homens de lata

Certo dia
Amei um homem de lata
Que era vazio feito boneco oco
E sua cabeça feita por tantas mecânicas
Palavras repetidas reproduzidas e sem capacidade de pensar além.
Era tão vazio
Que não havia espaço para nada.

Certo dia
Amei um homem de lata
E seus olhos de vidro não me enxergavam
E eu era como outro qualquer
E outro qualquer era como eu.
E não fazia diferença se eu estava ali
Porque ele não era capaz de sentir.

Certo dia
Amei um homem de lata
E o aprimorei
A tecnologia de seu cérebro foi aumentada
E seu corpo oco agora havia parte do meu.
Mas ainda assim não era o suficiente.

Certo dia
Amei um homem de lata
E o amei tanto
Que dei meu corpo por ele
Para que pudesse deixar de ser apenas um homem de lata
E que pudesse ter sentimentos
E talvez
Que pudesse me amar assim como o amei.

Certo dia
Amei um homem de lata
E ele me amou também
Porém meu corpo agora era oco
E quem virou lata
Fui eu.


segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Nono andar

Não há cabeça mais vazia
Que aquela que pensa em tudo.
E já não há asas
Que suportem meu peso
Muito menos as minhas
Que já estão destruídas
Quebradas e sem penas.
E se mal consigo voar do primeiro andar
Quem dirá do nono.
Grades me enjaulam como uma gaiola
E as janelas tão altas
Que apenas consigo olhar o céu
Cinzento
Nublado
Como pode algo tão grandioso
Ser tão solitário?

Como pode alguém que está no chão  querer estar no céu
E alguém que está nas alturas ser tão  seduzido pelo chão?

E se fosse possível
Minhas lágrimas já teriam criado um mar
E então poderia cair
Cair
Cair
E mergulhar
Me afundar
Ir até as profundezas
De mim mesma.

Se fosse possível
Eu já teria caído do nono andar.


segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Bonequinha de porcelana em Paris

Autora convidada: Ana Carolina Gonçalves

Ela havia conseguido. Finalmente, havia realizado o sonho de sua vida! E justamente quando a esperança havia acabado. Ali, tão perto de uma das maravilhas de fero do mundo, tudo, os problemas, as amigas, as notas insuficientes aos olhos dos pais, tudo havia evaporado. Parecia um sonho.
-Aqui. -Benjamin apareceu ao seu lado, oferecendo-lhe um copo de chocolate quente, muito bem-vindo no frio de Novembro. Ele era a única coisa que a fazia lembrar-se que eles realmente haviam chegado até ali.
Há três meses, eles se conheceram, em um café, próximo à casa de uma das amigas de Ava. Ele estava fazendo Desenho e ela pretendia fazer Medicina. Apesar dos amigos dizendo que exatas e biológicas não combinavam, os dois remaram contra um tsunami para ficarem juntos. Ela era menor de idade e, além de passar pelos pais dela, estavam burlando a Lei.
-Obrigada. -Ela se aninhou a ele e voltou a admirar a Torre. A Torre Eiffel. A bonequinha de porcelana, como a avó a chamava estava em Paris. -Sabe, minha avó e meu avô, eles viajaram o mudo inteiro. -Ela falava com um olhar sonhador. O mesmo olhar que fez Benjamim se apaixonar por ela. Ele viu seu reflexo naqueles olhos. Ele reparava muito nas pessoas e, com ela, não era diferente. Bem, a diferença, na verdade, é que, com ela, o Instagram havia ganhado um outro filtro, que as pessoas chamam de amor. -A primeira e a última parada deles foi aqui. Paris.-Ela disse o nome da cidade com tanto carinho, paixão e algo mais, que Ben não pôde explicar mais tarde no Diário de Bordo deles (ou Livro de Memórias, como Ava preferia).
-Ava? -Ela estava distraía (como sempre, viajando em sua própria dimensão), e ele teve que chamá-la mais uma vez. -Ava!
-O quê? -Ela se virou, espantada, quase derramando o chocolate, agora frio. Ele riu. Alguns metros mais adiante, artista de rua, fantasiados de palhaços, tocavam valsas. Ela riu, pesando o quão clichê aquela cena era, até que Benjamin fez algo... inesperado. Ele sumiu! Sim, isso mesmo. Ele a deixou sozinha no meio de franceses e turistas, sem contar as crianças pulando em volta dos palhaços, que haviam mudado a trilha sonora.
Um piano começou a tocar, atrás de Ava e ela se virou para encarar Benjamin, de terno e gravata, tocando Je Vais T'Aimer. Ela havia conhecido essa música no curso de francês e havia se apaixonado. Quando ele começou a cantar, porém, não foi o “A faire pâlir tous les Marquis de Sade” que saiu da boca dele.
Um sacolejo, seguido de um “bonsoir, mon  amour”, a despertaram daquele sonho maravilhoso.
-Duda, -Ben falou baixinho, apontando pra fora da janela, enquanto eles pousavam. -olha lá!
Em meio à prédios e árvores, lá estava ela.
-La Tour Eiffel. -Ela falou, baixinho, em um perfeito francês. O avião pousou e, em alguns minutos, o desembarque estava autorizado. Benjamin se levantou, colocando a mochila sobre os ombros, e lhe ofereceu a mão. A cidade luz e o amor de sua vida a esperavam. Ela aceitou, depois de ajeitar a touca vermelha. Os cabelos agora grandes demais, porém tão belos quanto antes.
Quando puseram os pés no chão do aeroporto, por um segundo, ela pensou que pudesse ainda estar sonhando. Mas, então, Ben a puxou para perto e a beijou. Ela se perdeu em seus braços, enquanto os dedos passeavam pelo recém-cortado cabelo castanho claro. Ela pensou; “bom, se isso é um sonho, então eu não quero acordar mais.” Ela o afastou e girou, ainda segurando sua mão.
-Eu te amo, Benjamin. -Ela riu, como uma criança que encontrou um unicórnio debaixo da árvore de Natal. -Eu te amo! -Ele abaixou a cabeça também e dá um sorriso tímido, achando graça da reação dela.
Como ele a amava! E ela, com certeza não tinha ideia da dimensão daquilo tudo. E ele estaria ali explicando, quantas vezes fosse preciso.
-Eu te amo, Ava. -Mal sabiam que aquilo era início, meio e fim. Tudo ao mesmo tempo.


segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Conexões

Olhe nos meus olhos
E sinta tudo o que eles têm a dizer
No meu olhar há ironias e cansaços
Mas também há dores e amores

Olhe para mim
E me ama apenas pelo olhar
Só através dele é que eu me entrego
me doo, me refaço e… ah....

As lágrimas caem… Inevitável…
Quem nunca chorou, não sabe amar
O choro é livre do seu olhar, mas é
Um modo de dor compartilhada

De supetão, os olhos sorriem
E os lábios fazem jus
O sorriso dos olhos é transcendental
Assim como nós, trocando olhares

O mesmo olhar que ama, mente
O mesmo que sorri, trai
Os olhos se incomodam
Os corações têm medo de se abrirem

Olhe para mim
E deixe o universo ao seu redor
Entrega-te, entrego-me
Já não somos dois

Olhe nos meus olhos
E eu já te amo
Quem sou eu?
Olhe nos meus olhos


Marcos Marinho - 04/06/15